Com combinação de véspera, aproveitámos a liberdade de não termos escola ao sábado e pespegámo-nos desde a aurora à entrada da mina, muito colados à parede e sem rumores para não afugentarmos os seus actuais moradores. Numa rapidez sem asas, perseguimos os pequenos morcegos munidos pelo mesmo radar que servia aos quirópteros para procurar alimento.
A ecolocação dos mamíferos voadores precipitava-nos também a nós na proximidade do rumor mais lento e esmorecido da concavidade donde o desgraçado do quadrúpede expiava há vários dias os castigos da fome, da sede, do abandono e da crueldade.
- Mal posso acreditar!... É o Farrusco, o velho Farrusco da Ti Prazeres!
- Coitado!, livraram-se dele. Quem comprou o rebanho não o quis levar.
- Pois foi! – lembrou a Candinha que estivera, até então, muito calada.
Parece que ele também só dava mostras de nos conhecer pelo júbilo da cauda. Os olhos semicerrados pareciam os dos morcegos que, um a um, se iam filando, pendurados pelas patas, no emparedado lateral escuso e no tecto da caverna alheados do rumor a que se tinham vindo a habituar desde a visita forçada daquele intruso. Imperturbáveis, digeriam a enchente de insectos, que se avizinharam das águas estagnadas da represa, ou algum anfíbio rugoso e desprevenido, durante a sua acostumada romaria por aquelas bandas. Escanzelado, as costelas do Farrusco desenhavam-se-lhe no ventre e as patas traseiras recusavam-se a suster-lhe em pé a pele e os ossos. No fundo da cova onde se tinha despenhado faziam-lhe companhia outras carcaças antigas completamente descarnadas. À sua volta, estas apenas alumiavam melhor a sua magreza!
- O Farrusco está ferido. Reparem no sangue empastado na perna bamboleante, do lado direito!...
Ao evedenciá-lo, Candinha quase se precipitava no buraco.
- Vamos tirá-lo já dali! – disse o Júlio decidido.
O rapaz tinha-se esquecido do ressentimento do animal perante a desumanidade dos homens e antes que se aproximasse dele foi preciso que as suas palavras doces lhe aquietassem o temor de uma nova traição, quando este lhe arreganhou os dentes em atitude defensiva.
- Deita, Farrusco! Deita! Eu vou buscar-te.
Com o Zé a pegar-lhe nos membros da dianteira e o júlio a segurar-lhe a parte detrás, puseram-no dentro do vagão desconjuntado, no qual se tinha dado o primeiro embate da queda. Depois, içaram-no em braços e galgaram o fosso. As raparigas apaparicaram-no com muitas festas e o cibo de pão guardado no bolsa da saia.
Em sinal de cooperação, o velho Farrusco queria parecer dizer-nos que se aguentaria serra abaixo. Afinal, palmilhara-a vezes sem conta! E, por causa disso, a Josefina olhou-o enternecida.
- Só podemos fazer isto de duas maneiras: descermos a encosta, num saltinho, e falarmos com o Professor ou irmos serra abaixo, um estirão, com ele ao colo. – opinou o Zé.
A Josefina achou muito melhor que nos encaminhássemos para o povoado. A Ti Betrenária lá daria conta do recado.
Assim se fez, para bem do Farrusco e alegria de nós todos!

- Mal posso acreditar!... É o Farrusco, o velho Farrusco da Ti Prazeres!
- Coitado!, livraram-se dele. Quem comprou o rebanho não o quis levar.
- Pois foi! – lembrou a Candinha que estivera, até então, muito calada.
Parece que ele também só dava mostras de nos conhecer pelo júbilo da cauda. Os olhos semicerrados pareciam os dos morcegos que, um a um, se iam filando, pendurados pelas patas, no emparedado lateral escuso e no tecto da caverna alheados do rumor a que se tinham vindo a habituar desde a visita forçada daquele intruso. Imperturbáveis, digeriam a enchente de insectos, que se avizinharam das águas estagnadas da represa, ou algum anfíbio rugoso e desprevenido, durante a sua acostumada romaria por aquelas bandas. Escanzelado, as costelas do Farrusco desenhavam-se-lhe no ventre e as patas traseiras recusavam-se a suster-lhe em pé a pele e os ossos. No fundo da cova onde se tinha despenhado faziam-lhe companhia outras carcaças antigas completamente descarnadas. À sua volta, estas apenas alumiavam melhor a sua magreza!
- O Farrusco está ferido. Reparem no sangue empastado na perna bamboleante, do lado direito!...

Ao evedenciá-lo, Candinha quase se precipitava no buraco.
- Vamos tirá-lo já dali! – disse o Júlio decidido.
O rapaz tinha-se esquecido do ressentimento do animal perante a desumanidade dos homens e antes que se aproximasse dele foi preciso que as suas palavras doces lhe aquietassem o temor de uma nova traição, quando este lhe arreganhou os dentes em atitude defensiva.
- Deita, Farrusco! Deita! Eu vou buscar-te.
Com o Zé a pegar-lhe nos membros da dianteira e o júlio a segurar-lhe a parte detrás, puseram-no dentro do vagão desconjuntado, no qual se tinha dado o primeiro embate da queda. Depois, içaram-no em braços e galgaram o fosso. As raparigas apaparicaram-no com muitas festas e o cibo de pão guardado no bolsa da saia.
Em sinal de cooperação, o velho Farrusco queria parecer dizer-nos que se aguentaria serra abaixo. Afinal, palmilhara-a vezes sem conta! E, por causa disso, a Josefina olhou-o enternecida.
- Só podemos fazer isto de duas maneiras: descermos a encosta, num saltinho, e falarmos com o Professor ou irmos serra abaixo, um estirão, com ele ao colo. – opinou o Zé.
A Josefina achou muito melhor que nos encaminhássemos para o povoado. A Ti Betrenária lá daria conta do recado.
Assim se fez, para bem do Farrusco e alegria de nós todos!