Por vezes, deambulando pelas aldeias do nosso concelho, ainda se conseguem destes instantâneos: um belo cavalinho pastando placidamente nas imediações do "povo", neste caso, na zona dos palheiros de Felgueiras.
O "equus caballus" (cavalo) que em remotíssimos tempos paleolíticos era caçado para servir de alimento ao Homem, viria a ser domesticado após o Neolítico, e, no dealbar da Idade dos Metais, atrelado a carros de guerra, como se vê nas representações artísticas do Egipto antigo, Assíria, etc., acabando por ser utilizado na Idade do Ferro como montada dos guerreiros, sobretudo com os Celtas e povos aparentados (após o séc. V a.C.) e daí por diante, desde os romanos até aos inícios do séc. XX.
Desde a época romana generalizou-se a utilização do cavalo como transporte individual, sobretudo associado aos "senhores", pois até tempos bem recentes a maioria das pessoas do povo utilizava o burro e/ou animais muares (basta lembrar que, na literatura ibérica do séc. XVII, o fidalgo D. Quixote montava o famoso cavalo Rocinante, enquanto Sancho Pança seguia "escarrapatchado" no seu modesto jerico).
Assim sendo, apesar de alguma "democratização" do uso do cavalo, não admira que, segundo um apontamento do Dr. Horácio Simões (veterinário municipal, desde os anos 30 até anos 80), por volta de 1942 havia no concelho de Torre de Moncorvo apenas 508 cavalos, enquanto os muares (mulas e machos) eram 551 e os asininos (burros) eram 2.260!
Já agora, do mesmo registo, consta que os bovinos eram 913, os ovinos 16.899, os caprinos 7.085 e os suínos 2.029. Seria interessante obter dados actuais, para melhor podermos cotejar o extraordinário decréscimo da pecuária local e regional.
terça-feira, 5 de janeiro de 2010
Relíquia faunística
domingo, 3 de janeiro de 2010
Felgueiras
"Subir a serra e caminhar para o mar! E eram altos os montes que rodeavam aquela aldeia de pedra, difíceis os caminhos que trepavam rumo ao mundo. Sair era sempre desejado, como se fora proibida a liberdade, a fuga àqueles paredões. O vento não corria nas encostas e o ar ia pesando nos ombros dos que olhavam o tempo, a voltar sempre ao que fora.
"Subir o monte e ir ver um oceano, um barco, uma partida. Sonhar com o que havia depois, com o que ficava nas mãos.
Um cajado forte e subirei o monte que me cerca, que me isola".
- Estas são palavras de Jacinto de Magalhães (in Trás-os-Montes, 1985), que bem poderiam ter sido escritas por Armando Martins Janeira ou Isabel Mateus...
À Diáspora moncorvense.
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
Tomé Rodrigues Sobral (1759-1829)
"Químico, mais conhecido como o “mestre da pólvora” e também como o “Chaptal português”, natural de Felgueiras, Moncorvo, nasceu a 21 de Dezembro de 1759, filho de João Rodrigues e Isabel Pires. Matriculou-se na Universidade de Coimbra, em Matemática e Filosofia, a 29 de Outubro de 1779. Foi ordenado presbítero na Arquidiocese de Braga em 1782, e concluiu o curso na Faculdade de Matemática e Filosofia em 26 de Junho de 1783. Foi demonstrador de História Natural a partir de Julho de 1986, substituto extraordinário para as cadeiras de Física em Outubro de 1786 e em Julho de 1788, História Natural em Julho de 1787 e Química em Julho de 1789. Sucedeu a Vandelli na direcção do Laboratório Químico em Janeiro de 1791, e foi nomeado Lente de Prima, proprietário da cadeira de Química e Metalurgia , ficando encarregado de elaborar o compêndio da cadeira, previsto nos Estatutos da Reforma da Universidade de Coimbra, de 1772, e que Vandelli nunca tinha elaborado.
Foi sócio da Academia das Ciências de Lisboa, Cavaleiro professo da Ordem de Cristo e deputado às Cortes Constituintes de 1821. Em 24 de Maio de 1828 foi nomeado vice-reitor da Universidade de Coimbra, não tendo chegado a aceitar o cargo por doença, morrendo um ano depois, em Setembro de 1829. (...)"
Mais informações em:
http://cvc.instituto-camoes.pt/ciencia/p17.html (fonte do texto em aspas e da imagem)
http://www.museudaciencia.pt/index.php?iAction=Coleccoes&iArea=3&iId=50
http://invasoesfrancesas.blogspot.com/2007/02/tom-rodrigues-sobral-1759-1829.html
http://dererummundi.blogspot.com/2008/07/o-batalho-acadmico-de-1808.html
quinta-feira, 19 de novembro de 2009
Novos professores, em ronda por detrás da Serra
Na passada semana, tendo em vista dar a conhecer a realidade paisagística, social, económica e patrimonial do concelho de Torre de Moncorvo, a direcção do Agrupamento Vertical de Escolas de Torre de Moncorvo promoveu uma visita guiada aos novos professores que aqui foram colocados.
Aspecto do altar-mor da capela do ermitério de Senhora da Teixeira, em mau estado de conservação e a reclamar obras de restauro urgentes.
quinta-feira, 27 de agosto de 2009
Exposição sobre Armando M. Janeira e livro de Isabel Mateus
"O local é o universal sem paredes", disse um dia o grande escritor transmontano Miguel Torga.
Pois se conjugarmos os temas da Exposição sobre o Embaixador Armando Martins Janeira que será inaugurada no próximo dia 29 de Agosto, pelas 11;00h, no Centro de Memória, com a temática do livro de Isabel Fidalgo Mateus, sobre a nossa Montanha (o Roboredo), ou, mais propriamente sobre o mundo de trás-da-serra, de onde partiram tanto o Embaixador como esta sua prima afastada, natural das Quintas de Felgueiras, temos a frase de Torga consumada na sua plenitude.
É que tanto a busca do Homem Universal intentada por Janeira, como esta demanda do local procurada por Isabel Mateus, têm como referência sempre o "locus" de onde partiram.
Ambos embaixadores, cada qual à sua maneira, pois a Doutora Isabel Mateus é, presentemente, professora na Universidade de Liverpool, onde muito bem representa a nossa terra (e de onde nos envia as suas crónicas para o blogue), ambos tiveram percursos similares embora em contextos cronológicos distintos: o jovem Armando frequenta aqui aprende as primeiras letras nos anos 20 do séc. XX, enquanto a pequena Isabel por aqui andou à escola nos anos 70 e 80.
Todavia, ambos devem ter subido um dia ao alto da Serra e imaginado que havia mais mundo, e partiram. Também Armando Martins Janeira passou por Inglaterra, antes de se fixar por mais tempo no Japão e na cultura japonesa. A Isabel deambulou por Portugal e Europas (o marido é italiano, passo a inconfidência), antes de se fixar (ao presente) no Reino Unido.
Em suma, dois felgueirenses (do concelho de Moncorvo), que sentiram a tal pulsão de evasão e se projectaram no mundo exterior, buscando a universalidade, mas que nunca esqueceram as suas raízes. Um cumpriu já o seu destino e é a personalidade de excepção que se conhece. A nossa contemporânea está a concretizar também o seu percurso, e daqui lhe desejamos um futuro à medida dos seus desejos - mas tendo sempre presente o magneto do Roboredo a orientar a sua bússola.
Sábado, a partir das 11;00 h no Centro de Memória.
Para saber mais, ver os seguintes post's, no nosso blogue:
- sobre Armando M. Janeira:
http://torredemoncorvoinblog.blogspot.com/2009/02/biblioteca-iv-ainda-armando-martins.html
- Sobre Isabel Mateus:
http://torredemoncorvoinblog.blogspot.com/2009/04/outros-contos-da-montanha-de-isabel.html
quarta-feira, 22 de abril de 2009
Descobrir
Mestre,
Ideias novas não surgem,
Apesar de tanto pensar!
Apesar de tanto pensar,
Ideias não emergem,
Mestre!
Olho de um e de outro lado,
Como me tens tanto ensinado,
Olho o caminho já caminhado,
E nada, nada de novo vislumbrado!
Que problema, mestre!
Estou cansado, olhos sem ver, enraivecido,
Quase tudo me parecendo ter esquecido;
Mas lembro-me de ti a dizer
Que solução há-de haver!
Dizes-me que talvez este ainda não seja
O tempo para o meu fruto colher,
Por tempo ainda o fruto não ter
Para, naturalmente, amadurecer.
Dizes-me ainda que tranquilo esteja
E a reflexão ao sol deixe a aquecer.
Olhos semi-cerrados,
Abertos e fechados,
Vendo sem ter de ver,
Por profundo saber,
Em sábio gesto de mundo abarcar
Dizes-me ainda para descansar e olhar!
Olha!
Olha a borboleta lá fora,
A chamar-te,
A voar na primavera,
Voando de flor em flor,
Em hino ao amor.
Olha,
Faz isso, vai com ela,
Procura a luz,
Olha o céu,
Voa, voa, voa,...
E volta,
Tranquilo!
Volta então à tua reflexão.
Fixa bem os pressupostos,
Define bem os objectivos
E parte, decidido, a caminhar,
À procura da certa solução
Que decerto vais encontrar.
Minimiza o duro caminho,
Que é duro o caminho
E, quantas vezes, difuso,
Em nevoeiro escondido.
Chora quando tiveres que chorar!
Vê os desvios do caminho,
Assinala-os com raminhos de acácia
Mas não te desvies do traçado primordial.
Talvez a eles possas voltar mais tarde,
Quem sabe se para muita sede
Poderes então saciar em inesperadas fontes
Que neles poderás então encontrar,
Para novas lágrimas poderes chorar!
Mas não te deixes agora inebriar.
Olha os pressupostos e os objectivos;
Olha apenas o caminho principal,
O caminho principal!
Ao caminhar,
Faz como o vedor,
Mesmo que nele não acredites;
Sente os sinais,
Mesmo que sinais
Não te pareça encontrar.
Há sempre sinais!
Vai caminhando,
Pára de vez em quando,
Refresca a mente,
De lágrimas eventualmente,
E sente!
Há sempre sinais!
Sente o pulsar do coração
E o pular do pensamento!
Caminha e sente,
Que há sempre sinais!
Há sempre sinais!
....
Sim, mestre,
Estou a sentir,
A ver afloramentos,
A fazer acontecimentos,
A descobrir!
Obrigado,
Mestre!
2009-02-20
J. Rodrigues Dias
1.ª Fotografia - Pormenor lateral da Igreja Matriz de Torre de Moncorvo.
2.ª Fotografia- Pormenor numa Capela de Felgueiras.
terça-feira, 31 de março de 2009
À Descoberta, até Felgueiras
Os primeiros dias de Primavera estiveram convidativos para um longo passeio. Foi o que eu decidi fazer, em companhia dos meus dois filhos, no dia 28 de Março.
O passeio iniciou-se no coração do vale da Vilariça, mais concretamente na ponte da Junqueira, precisamente onde começa o concelho de Torre de Moncorvo. Quem por ali passa quase nem se apercebe da existência de uma ponte mais antiga, uns poucos metros mais abaixo. Essa ponte foi destruída numa cheia que ocorreu a 17 do Junho de 1955, ainda assim se mantém desde então.
A primeira paragem foi na Junqueira. O dia estava frio, mas bastante agradável para passear. A primeira tentação foi trepar a um dos cabeços a nascente da pequena aldeia. Tivemos que desistir a meio, mas a tentativa valeu a pena. Conseguimos uma visão diferente. Estou mais habituado a ver a Junqueira do alto da aldeia abandonada do Gavião, espreguiçando-se indolente ao sol do fim da tarde.
Descemos de novo à aldeia e percorremos as principais ruas. Pouco depois, já quando partíamos em direcção a Moncorvo, alguém se sentiu incomodado com a nossa presença, adoptando uma postura muito hostil. São os contratempos de partir À Descoberta, nunca sabemos quem vamos encontrar pela frente.
Já em Moncorvo procurámos um restaurante para almoçar. Escolhi uma ementa mais ao gosto dos meus jovens acompanhantes, não queria “castigá-los” também com a refeição. Depois do almoço fizemos um passeio pela Corredoura. Tentei encontrar elementos dos contos da Júlia, bruxas, lobisomens, mas apenas me consegui recordar do calor das noites de Verão de quando ali vivi.
Subimos depois ao Museu do Ferro. O Nelson tinha recolhido em Freixo algumas imagens dos Sete Passos que me queria mostrar. Vistas as imagens (e muita conversa depois), continuámos o percurso, porque o nosso destino era Felgueiras.
De repente, o céu escureceu. Levantaram-se fortes rajadas de vento que trazia uma tempestade de areia Reboredo abaixo. Andam máquinas gigantescas a surribar os cumes que arderam recentemente! Começaram a cair algumas gotas. Procurámos refúgio na capela de Nossa Senhora da Teixeira.
A chuva já caía raivosamente, estava tudo escuro e revoltoso à nossa volta. Por momentos sentimos o isolamento do ermita que aqui habitou no século XVI. Esquecemos a chuva, o vento, para dedicarmos algum tempo a admirar os frescos que decoram a galilé. Vale bem a pena fazer uma visita a esta capela. Eu já a conhecia, mas foi bom visitá-la de novo, até porque pelo facto de ter que responder a uma série de perguntas dos meus acompanhantes me levantou muitas questões. Porque é que está ali, no meio daquele descampado, numa construção tosca, um vasto conjunto de frescos inspirados possivelmente em El Greco e na Capela Sistina? Porque é que esta preciosidade não está mais protegida?O tempo melhorou. Despedimo-nos da pietá, que nos franqueou a entrada, e voltámos à estrada. A paragem seguinte foi na Açoreira. Não deixa de ser curioso manter-se na Açoreira o culto a S. Marinha, também existente no concelho de Vila Flor e que remonta talvez do séc. IX. A sua festa é no Domingo de Pascoela, uma boa ocasião para se conhecerem algumas tradições da Açoreira.
A aldeia tem certamente origens bem antigas, como o provam as suas casas e palheiros em xisto.A etapa seguinte esperava-nos a poucos quilómetros, Maçores. Percorremos algumas ruas da aldeia, mas o que nos marcou mais foram mesmo alguns palheiros circulares, em xisto, que perecem ter sido retirados de um filme sobre uma civilização antiga.
Deixámos Maçores em direcção a Felgueiras. A estrada, com acentuado declive, em pouco tempo nos colocou a quase 800 metros de altitude. O tempo melhorou ligeiramente mas nada que nos permitisse usufruir de toda a beleza que se pode contemplar deste ponto tão elevado. Pode-se “voar” até Peredo dos Castelhanos, e, com pequenos saltos de pardal, passar para Urros, depois Ligares, ou então olhar em sentido oposto e apreciar a Primavera que acorda em cada planta que cobre a serra de um verde rasteiro. Giestas, urzes, arçâs, estevas e sargaços são algumas das espécies que completam os espaços que os sobreiros, pinheiros e zimbros dominam.
Chegámos, por fim, a Felgueiras. A receber-nos estava a capela de Sta Edwiges, nome que sempre me causou alguma estranheza. Sei hoje que esta santa é a protectora dos pobres e endividados. A sua história é muito interessante e o seu papel social na ajuda dos mais necessitados é um bom exemplo para os dias que atravessamos.
Quase sem querer, cortei à esquerda nas primeiras casas. A minha intuição era de que o Lagar da Cera se situaria nessa direcção. Mesmo 14 anos depois, não me enganei! Embora em Felgueiras haja várias actividades económicas, é a cera que torna esta aldeia singular (também o trabalho do ferro teve grande tradição). Foi o lagar comunitário da cera que trouxe Santos Júnior a Felgueiras e que tem também levado a aldeia por várias vezes à televisão. O lagar, situado perto da ribeira de Santa Marinha (!), resiste ao tempo, mostra as suas rugas, mas não é tratado como merece. Se o projecto da sua recuperação foi distinguido em 1987, que se passou então? É pena que também este património esteja a perder-se pouco a pouco. Há que unir esforços. Não podemos esperar até que a sua preservação e recuperação sejam impossíveis.
Perto do lagar pude apreciar um espaço agradável, com uma original fonte. O painel de azulejos, apesar de moderno, está bem enquadrado no conjunto. Noutros pontos da aldeia há outros espaços, igualmente arranjados, alguns resultantes da demolição de casas abandonadas.
As casas onde se produzem velas estavam fechadas. Percorremos a aldeia. Tal como tantas outras, são evidentes os sinais de abandono. As pessoas mostraram-se afáveis, prestáveis, embora curiosas. Só um céu negro e uma chuva forte nos impediu de continuar À Descoberta de outros pontos de interesse da aldeia. Foi sem dúvida um bom passeio (de reconhecimento).
Voltámos à estrada, em direcção ao Carvalhal.Quando atingimos o ponto mais alto do percurso, 831 metros, alguns farrapos de neve vieram colar-se ao pára-brisas do carro. O frio era muito e abstivemo-nos de fazer mais paragens no percurso. Descemos à vila, atravessámo-la e seguimos até à Foz do Sabor. As sombras já começavam a cobrir o vale. Seguimos pela estrada das Cabanas até à Quinta da Silveira, e depois até à Ponte da Junqueira.
Lavámos um par de horas a percorrer 73 quilómetros de estrada, mas “Descobrimos” um bom pedaço do concelho! O dia, risonho de manhã, trocou-nos as voltas à tarde. Mas, mesmo assim, valeu a pena. Este é um reino maravilhoso que vale a pena descobrir.
segunda-feira, 30 de março de 2009
Felgueiras, lagar da cera
Em Maio de 75, era eu sócio e director da cooperativa de cinema Cinequanon, organizei duas idas a Moncorvo para as filmagens de dois documentários, ambos fazendo parte da série de programas Artes e Ofícios, para a R.T.P.: "Estevais Ano Zero" e “Velhas Profissões”. Neste último estão integrados uma tecedeira e um oleiro do Felgar, o lagar da cera em Felgueiras e um moinho. Este documentário encontra-se no Museu do Ferro e na Biblioteca de Moncorvo à disposição de todos. A equipa de filmagens era a seguinte: Sá Caetano na realização; eu, Leonel Brito, na produção e entrevistas; Elso Roque na imagem; João Diogo no som.