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segunda-feira, 16 de junho de 2008

Caminho Antigo e Ponte do Sabor

".........................olhando ao longe a estrada

que vinha de Moncorvo, em íngreme calçada,
entestar com a ponte..."

Ilustrando estes versos de Campos Monteiro, aqui fica uma fotografia dos anos 50, onde se vê ainda a casa dos cantoneiros da J.A.E.. (do lado direito) e uma outra, em xisto, que segundo a tradição foi estalagem dos almocreves. Ambas as construções foram demolidas pouco antes da construção do troço do IP-2 entre o Pocinho e esta ponte, no final dos anos 80. A partir da casa dos cantoneiros e subindo a encosta, vê-se ainda o antigo caminho medieval, em uso até aos anos 30 do séc. XX, e a que fizemos menção no "post" anterior.

Fotografia dos anos 50 do séc.XX. Autor Engº Gabriel Monteiro de Barros (Arquivo PARM/MFRM)

Para melhor se compararem as diferenças, aqui fica outra fotografia (2006), antes das obras actuais (ver fotos de Aníbal Gonçalves, no "post" de 14.06.2008):


Ponte do Sabor, vista do mesmo ângulo da anterior. Foto de Rui Leonardo, 2006

Ainda uma vista do mesmo lado, durante uma cheia. Foto de N.Campos, 25.11.2006

O alardo da Vilariça

"... e este foi o mais formoso alardo
que até ali em Portugal fôra visto.
Fernão Lopes - "Chronica de D. João I"

N'essa primaveril manhã de Pentecoste,
d'el-rei D. João Primeiro a fatigada hoste
acampara no plaino à beira do Sabor.
Temendo uma surpresa, el rei mandara pôr
esculcas na colina, olhando ao longe a estrada
que vinha de Moncorvo, em íngreme calçada,
entestar com a ponte. A rude soldadesca,
dos álamos à sombra apetitosa e fresca,
descansava da marcha abrupta da montanha.
............................................................................ (continua)

- Campos Monteiro, Musa irónica, Porto, 1924 (2ª ed.)


Este excerto de um poema do escritor moncorvense Campos Monteiro (ver "posts" anteriores, de autoria de Rogério Rodrigues) baseia-se num episódio relatado pelo cronista Fernão Lopes, que foi o encontro das hostes de D. João, Mestre de Avis, e de D. Nuno Àlvares Pereira, algures nos campos da Vilariça (em Maio de 1386), já depois da batalha de Aljubarrota, a qual se deu, como é sabido, a 14 de Agosto de 1385. Aqui se realizou, no dizer do cronista, "o mais fermoso alardo" que até então se vira em Portugal.

Um "alardo" era um exercício de tropas em parada, de infantaria e de cavalaria, tendo reunido, neste caso (e segundo Fernão Lopes) cerca 4.500 lanças. Deveria ter sido, de facto, um espectáculo formidável, com as cores dos pendões, das aljubas, os loudéis, e o reluzir das armaduras, dos elmos e das pontas das lanças, brilhando ao sol... Como é óbvio este "espectáculo" tinha também o seu quê de propagandístico, procurando afirmar uma nova realeza e uma nova dinastia (a de Avis).


Vista do vale da Vilariça (à direita) a partir do miradouro de S. Gregório. À esquerda, o morro da Vila Velha/Santa Cruz da Vilariça

Não sabemos o exacto local do alardo, mas não seria de admirar que fosse nas imediações de Santa Cruz da Vilariça, que nessa altura já era uma povoação fantasma. Em todo o caso, imaginamos que se deve ter povoado pelo menos por esse dia, tal como os montes em redor, com as gentes de Torre de Mencorvo e de Vila Frol (que tinham tomado o partido do Mestre de Avis), assim como de todas as aldeias cercanas, para assistirem, do alto, a um tão grande e belo (e bélico) acontecimento!... Além disso, nos pontos altos, certamente que se postaram "esculcas" (sentinelas de atalaia), como imaginou Campos Monteiro. Onde a imaginação do escritor falha é no pormenor da ponte, que não é credível que já existisse, pois é do século XVI.

De Torre de Moncorvo à ponte do Sabor vinha ter, de facto, um caminho antigo, seguramente medieval, utilizado até aos princípios do séc. XX (antiga Estrada Real), que atalhava para o rio depois do "Sobreiro da Meia Légua". Aqui havia ainda um atalho, conhecido por Atalho das P..., o que não deixa de ser curioso como tão longe se postavam no seu "ofício" as mulheres mundanas, pois é local muito afastado, quer de Santa Cruz da Vilariça, quer de Torre de Moncorvo. Ou o topónimo/designativo, terá tido outra origem/sentido?

No início dos anos 80 do séc. XX, na parte terminal do caminho, da margem esquerda antes da ponte, havia ainda um troço de calçada, destruído pelo IP-2. O mesmo IP-2 que se prepara agora para desfigurar o lado Poente do cabeço da Vila Velha e sabe-se lá mais o quê... (esperemos que do mal, o menos).

sábado, 14 de junho de 2008

Entre a ponte do Sabor e as ruinas da Vila Velha


O desafio de partir À Descoberta do concelho de Torre de Moncorvo, não tem nada de difícil, só é necessário partir. Desta vez escolhi dois motivos bastante próximos: a Ponte do Sabor e as ruínas da Vila Velha de Santa Cruz.
A tarde não estava muito convidativa. Quem vive ou já viveu em Moncorvo, sabe o que significa fazer calor, nestas paragens! Talvez por isso, o Rio Sabor já era frequentado por um número considerável de pessoas, a pescar, a brincar na água, ou mesmo a apanhar sol, que apesar de encoberto, cada vez que se mostrava, “queimava” a pele.

Parei o carro mesmo junto à ponte do Sabor, na EN325. Esta foi intervencionada recentemente, ao nível dos pilares, do tabuleiro, da pavimentação e dos passadiços marginais, estando agora com um aspecto impecável. A ponte mostrava já o peso da idade, apresentando mesmo algum risco ao trânsito. O seu futuro é incerto. Não “encaixa” no traçado do IP2, e, com a tão badalada Barragem do Sabor, corre o risco de ficar submersa. Na estrada, entre a ponte e a Quinta da Portela está marcada nas rochas, a cal, a cota 139 metros. Terá essa marcação algum significado? A ter, a água chegaria muito perto das casas da Quinta da Portela!

Desci ao rio a jusante da ponte. Um casal de aves de rapina fazia um gracioso bailado e enormes peixes debatiam-se nas águas pouco profundas sobre um banco de areia ali próximo. Penso que a época da desova já passou!
Disparei algumas fotografias em direcção à ponte. A sapata dos pilares foi reforçada e todas a juntas estão tapadas. Os sete arcos de volta redonda são desiguais. Há olhais rectangulares sobre cada um dos fechos dos arcos. Os passeios apoiam-se numa cachorrada, como a que existe em algumas igrejas! As guardas são de ferro, novas. As antigas foram substituídas na última interverção. A ponte foi construída na idade média, mas foi alterada no Séc. XIX. O seu aspecto a montante e a jusante, é bastante semelhante, à excepção dos contrafortes do arco central que apresentam reforços, a montante.

Na erva verde da margem do rio encontrei as primeiras flores de fel-da-terra (Centaurium umbellatum), com o seu rosa característico, que encontraria em quantidade no alto do cabeço.
A subida até às muralhas da antiga vila de Santa Cruz da Vilariça, Vila Velha de Santa Cruz da Vilariça ou Derruida, foi penosa. Caí na asneira de ir de calções. Além dos danos causados nas pernas, cheguei ao fim do passeio com quase meio quilo de sementes espetadas nas sapatilhas e nas meias, de cada pé! Apesar de a pujança de Maio e Abril já ter passado, ainda há muitas plantas em flor e rapidamente me esqueci das dificuldades, para começar a desfrutar do passeio. Encontrei muitas borboletas, abelhas, aranhas e toda a qualidade de bicharada. Também o cuco fazia ouvir o seu canto lá para os lados das Cabanas. O perdigão procurava parceira num monte próximo. À medida que ia subindo, ia-se alargando o horizonte e compreendi porque razão o homem aqui se fixou, desde o Séc. XII.

Não foi a primeira vez que visitei estas ruínas, já aqui tinha estado em 1992. Sempre gostei de passear nestas montanhas! Tinha prazer em fotografar os lírios em flor, que aqui abundam. Curiosamente encontrei frutos com sementes de lírio (Iris germanica), estava convencido que apenas se reproduziam por caules (rizomas)!
As ruínas da vila, que além das designações que já disse contou ainda com a de Vila Rica, Mesquita, Roncal e São Mamede, estão situadas num cabeço com 245 metros de altitude, entre a Ribeira da Vilariça e o Rio Sabor. Estranhamente poderá ter sido esta proximidade a tanta humidade que ditou a sua morte, contrariamente à lenda do ataque de formigas, que já tantas vezes ouvi contar.
No início do séc XIII Vila de Santa Cruz da Vilariça, recebeu, de D. Sancho II, uma carta foral que lhe concedia importantes isenções a regalias fiscais e penais. A mudança da população para Torre de Moncorvo deve ter-se dado no final desse século, sendo possível que os dois povoados tenham coexistido.

A localidade tinha muita importância, era sede de concelho na Idade Média, abrangendo parte dos actuais concelhos de Alfândega da Fé, Carrazeda de Ansiães, Vila Flor e Torre de Moncorvo.
Percorri toda a plataforma antes de me dirigir ao ponto mais alto, ao centro. A muralha ainda está bastante preservada, tem vários metros de altura nalguns locais, sendo ainda intransponível. Há pontos em que se distingue mais de uma muralha. A poente são bem visíveis os restos de dois torreões, circulares, que deviam ladear a única entrada. Em vários pontos distinguem-se restos de paredes de casas e de caminhos.

Por fim, dirigi-me ao ponto mais elevado das ruínas. Aqui existem sepulturas escavadas nas rochas, junto do local onde se pensa ter sido a igreja. Ainda se distinguem algumas paredes e encontrei blocos de granito rusticamente aparelhados. Todas as muralhas e paredes interiores são construídas em xisto, por isso chama a atenção a existência de granito neste ponto. Também há argamassa presa a algumas pedras, não sei se se trata de cimento. É um sinal mais do que evidente da existência de uma construção até uma data bem recente. Não me admirava que depois da vila ter sido abandonada, aqui se tenha mantido a igreja, ou uma capela, durante vários séculos.

Já por diversas vezes aqui foram feitas escavações. É uma pena não haver um estudo mais aprofundado deste local. Imaginei-me a participar nas escavações, deve ser muito interessante esse tipo de trabalho. O local está em completo abandono. Cresce mato por todo o lado e, mesmo para aqueles que se interessem em o visitar, não é uma tarefa fácil. Pior do que subir ao local, que pode ser feito por um caminho partindo da Quinta da Portela, é a circulação em volta e no interior das muralhas. Nalguns lugares é mesmo impossível circular.
Do alto do cabeço tem-se uma vista ímpar sobre o vale. Procurei um lanço de muralha mais segura e instalei-me para saborear o final de tarde. Não pude deixar de sorrir com a velocidade com que os veículos circulam ao longo do vale! O som do acelerador a fundo perturba a calma do morro. Que feliz me sinto por poder desfrutar destes momentos de paz!
O sol foi-se encolhendo. A luz subiu pelo Reboredo acima com a mesma calma com que as águas do Sabor se diluíam no Douro, lá ao fundo, na Foz. Os insectos pareciam agitados, tentando aproveitar os últimos raios de sol. Também eu queria aproveitar todos os momentos. Liguei o flash e “persegui-os”, até nos momentos mais íntimos.

Quando só já havia silêncio em redor, desci a encosta, de novo em direcção à Ponte do Sabor.
Não me arrependi das escolhas que fiz para este passeio. Dividi-me entre a ponte e a vila, entre a água e a montanha, entre a história e a suposição, entre a beleza das pequenas formas de vida e a imensidão de um vale que nos surpreende e encanta, sempre que paramos para o olhar.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Contos de Rodapé

Urtiga

A caça ainda une os companheiros no banco da praça. Agora que as pernas estão mais perras do que uma culatra enferrujada, o grupo vai-se arrastando até ao centro da vila, para que a língua recorde as chumbadas, pelos cabeços e carrascais. Era um orgulho trazer um cinturão suspenso de animais.
Como um burro teimoso, Aníbal era o último a unir-se ao grupo:
- Ainda estou meio empanturrado! O coelho bravo do almoço estava uma maravilha! A minha mulher tem cá um dedo para o compor...
- Pois é ! – ladraram os outros – Há cães que têm sorte! Nós ficamo-nos por um caldito, uma sardinha assada e é um pau!
O outro ensaboava a barriga, como que a fazer inveja aos elementos restantes da associação do gatilho. Depois de um café, entornaram a conversa para o passado, altura em que as perdizes, nas ladeiras do Douro, acompanhavam, a passo, o comboio. Agora, nem uma coisa nem outra. Talvez as malandrecas tivessem apanhado a carruagem de primeira classe e adeus! Os porcos bravos ainda galgam pelas serras, embora lhes façam muitas esperas. A morte de um destes, por uma arma de dois canos, fora da lei, foi aperitivo para o paleio do outro dia. Como de costume, Aníbal era o último a arrastar a cadeira para a mesa dos gatilheiros. O palito do almoço ainda bailava entre os dentes, à espera de ser manchado pelo café:
- Ainda trago aqui um restito de javali encalacrado nos dentes. Parece um fio de estopa.
- E queixa-se, tio Aníbal! Nunca se lembram de nós. Nem, ao menos, uns coiratos para amostra! Se me dessem uns rijõezitos, até era capaz de ir buscar força para escavar coelhos no meio das fragas! – resmungava Chico.
- Por falar nisso, lembro-me de uma cadela que, em três tiros, me trazia quatro coelhos! – lampejou António. Porcos nunca apanhei, mas não me importava de provar agora um naco de um berrão assadinho na brasa.
- Quem tem amigos não morre de desejos! – palitou estas palavras o atrasado do costume.
O dia de feira misturava as farturas com as bacias de plástico, os caldeiros de lata, os chás das maleitas e a confusão no Banco. Com tudo isto, Aníbal acabou por chegar ainda mais atrasado. Entretanto os comparsas resolveram tirar a limpo aqueles almoços com carne do monte e já tão raros. Benigno, empregado da farmácia, poderia arranjar um remédio. Havia lá uma gaveta com uma mixórdia qualquer capaz de pôr cá fora tudo o que o gabarolas tinha comido!
- Aí vem ele! Amanhã faremos a prova dos nove! Saberemos a cor do porco assado em mentiras! – empolgava-se António.
- Ó rapaziada, esta confusão da feira fez demorar o almoço. A mulher foi comprar umas coisas... Mas ainda bem, porque lhe trouxeram uma lebre que ainda me vem a saltar na barriga.
- Ai tio Aníbal, tem de beber já um bagacito para ver se a bicha adormece e lhe deixa tomar o café em paz! – insistiu Benigno, para expulsar aquelas aldrabices. Sem qualquer um se aperceber, amigou-se de uma saquita de açúcar intacta e caminhou para a farmácia. Com cuidado, substituiu o que era doce por algo mais azedo, com a mesma cor, e fechou o invólucro, escondendo aquela pólvora branca.
A praça General Claudino estava à espera da nova peta e escutou mais uma vez o palito a tagarelar:
- Já estou enjoado de tanto coelho bravo!
- Tome então o cafezinho para desenjoar! – respondeu Benigno, escostando à chávena o açúcar de farmácia.
O gole da mistela puxou rápido o enjoo. As tripas pareciam querer sair todas ao mesmo tempo, levando o palito de rastos. Num jacto, a calçada ficou pintada de berças e essências de urtigas.
- Ó tio Aníbal, está-me cá a parecer que andou a ruminar o pasto dos animais!

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Cardanha


Relógio de sol na igreja matriz da Cardanha.
07-06-2008

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Festa de Santa Leocádia II - Procissão

Em resposta ao nosso colaborador e amigo A.Basaloco (ver post de 6.06.2008, sobre a festa de Santo Cristo), então aqui vai uma prova de que, ao menos na festa de Santa Leocádia, a Tradição ainda é o que era:








2008.06.10 - Fotos de autoria de Luís Lopes (Arquivo Fotográfico da Junta de Freguesia de Torre de Moncorvo)

Festa de Santa Leocádia

Há anos que tem lugar esta festa, organizada pela Junta de Freguesia de Torre de Moncorvo, em redor da capela de Santa Leocádia, um dos mais belos miradouros do Roboredo, sobre a vila de Torre de Moncorvo. Contudo, este ano, a referida Junta, presidida por Milú Pontes, resolveu caprichar, estendendo a festa por quatro dias, aproveitando o prolongamento propiciado pelo feriado do 10 de Junho.
Vista geral de Torre de Moncorvo, a partir do miradouro de Stª Leocádia ou S. Bento
Em rigor, devemos dizer que a capela de Santa Leocádia (propriedade da Junta de Freguesia), era outrora conhecida por S. Bento, pois aí está também a imagem deste Santo, que até é de tamanho maior, pelo que este era, originalmente, o patrono da capela. Assim aparece nomeado este local em documentos antigos e ainda nas cartas militares de Portugal (à escala 1:25.000, dos anos 40 do século XX). Dada a antiguidade da imagem de Santa Leocádia (muito rústica, diga-se de passagem) pensamos que ela já lá deve estar também há uns séculos.
Outra vista de Moncorvo, emoldurada por zimbros e pinheiros.

A nosso ver, a predominância da devoção popular a Santa Leocádia em detrimento de S. Bento deve ter ocorrido já no séc. XX, sobretudo no período da guerra do Ultramar, ou seja, durante os anos 60. Julgamos que tivesse sido assim porque aí se encontram várias fotografias de militares fardados, colocadas seguramente pelas suas mães, esposas, ou outros familiares. Se estamos enganados, pedimos o favor que nos corrijam.
Aspecto geral do arraial, na tarde de 10 de Junho de 2008

Sobre a origem da capela julgamos que se possa situar no século XVII (por exemplo, o célebre santuário de S. Bento de Porta Aberta, no Gerês, remonta a 1614), ou seja num período em que a chamada Contra-Reforma, ou Reforma Católica, procurava exaltar a religiosidade popular e introduzia a espiritualidade do Barroco. A localização de capelas nos pontos altos, buscando essa proximidade com o Altíssimo e, ao mesmo tempo, impondo a sua omnipresença/visibilidade ao mundo terreno, parece ser uma constante desse período. Para esta construção, assim como para a capela de S. Lourenço, ou mesmo de Santa Teresa (na Quinta das Aveleiras) devem ter contribuído também os frades do convento de S. Francisco de Torre de Moncorvo (que ficava no local onde está o Asilo Francisco Meireles). Partindo do convento, é bem possível que os frades percorressem os caminhos da Serra, fazendo os seus retiros espirituais e de oração a estas capelinhas alinhadas sobre o dorso da montanha. Sabemos que todas elas, no século XVIII, tinham eremitões (guardiães das capelas), vivendo seguramente de esmolas.

Momento da actuação da tuna dos Amigos da Lousa-Horta da Vilariça-Vilarinho da Castanheira

Na referida capela existem as seguintes imagens: S. Bento, com um livro na mão e um báculo de Abade e um corvo aos pés, Stª Escolástica (irmã de S. Bento) e Santa Leocádia, estas duas de dimensão mais pequena e de talhe mais rústico, talvez obra de um artista local, eventualmente algum frade do referido convento franciscano. Podem ser obras do século XVII, e foram objecto de um inventário recentemente elaborado pelo Dr. Luís Lopes, ao serviço da Junta de Freguesia de Torre de Moncorvo, que culminou na Exposição de Arte Sacra "Memórias de Fé", inaugurada em Março do corrente ano, no Centro de Memória de Torre de Moncorvo.

Capela de S. Bento/Stª. Leocádia (exterior e interior)

Refira-se que Santa Leocádia foi uma virgem e mártir, que viveu entre o século III e IV (morreu em 9 de Dezembro de 303 ou 304) em Toledo, na Hispânia romana. Como era uma jovem de origem nobre, as autoridades romanas quiseram dar-lhe oportunidade de abjurar o Cristianismo (durante as perseguições de Diocleciano), mas, perante a sua persistência na Fé cristã, foi encerrada numa masmorra, parece que no local do célebre alcácer de Toledo, onde viria a morrer. Após a invasão árabe, iniciada no ano de 711, as suas relíquias foram levadas para Oviedo, onde permaneceram até ao final do séc. XI, quando Afonso VI terá permitido que um conde do Hainaut, peregrino de Santiago e participante na Reconquista cristã da Península, as levasse para uma abadia na Bélgica. No reinado de Filipe II este conseguiu que as ditas relíquias voltassem a Espanha, sendo devolvidas à Catedral de Toledo no meio de grandes festividades, em 1587. Assim, é possível que o culto de Santa Leocádia tivesse recrudescido neste período (finais do séc. XVI-inícios de XVII).

Santa Leocádia é a Padroeira da cidade de Toledo, encontrando-se o seu culto difundido no Norte de Portugal (zona de Chaves, Baião, Lamego), onde existem várias freguesias que têm Santa Leocádia como orago, ou até assim chamadas.

S. Bento e Santa Leocádia

Quanto a S. Bento, nasceu em Nursia (Itália), por volta do ano 480 e morreu em 21 de Março de 547, no mosteiro de Montecassino. Foi o fundador da Ordem de S. Bento (Beneditinos) e são-lhe atribuídos vários milagres. De uma das vezes, um padre, cheio de inveja pelo sucesso de S. Bento junto dos fiéis da sua paróquia, resolveu mandar-lhe um pão envenenado. S. Bento, adivinhando o intento, ordenou a um corvo que levasse o pão para um local onde ninguém o encontrasse, ao que a ave prontamente obedeceu, tendo voltado para junto dele. Esta é a explicação para a presença do corvo aos pés do Santo (ver a fotografia). Não deixa de ser curiosa a coincidência (ou não!) desta ave com a lenda dos corvos que está na origem de Torre de Moncorvo, sendo este um dos elementos da heráldica municipal desta vila e concelho.

Vale a pena subir à Santa Leocádia para se ter esta vista aérea sobre o burgo moncorvense...

N.Campos (PARM)

domingo, 8 de junho de 2008

Á descoberta da Adeganha

Hoje (dia 7), a Descoberta levou-me até à Adeganha. Não podia ter feito melhor escolha. A freguesia da Adeganha é muito grande e cheia de história e estórias. Embora tenha passado em várias povoações, é nela que vou centrar hoje a atenção.
Apesar de situada a menos de 500 metros de altitude, quando se parte do Vale da Vilariça, a pouco mais de 150 metros de altitude, parece complicado chegar a Adeganha. Apresentavam-se-me duas alternativas: subir a N215 que passa na Junqueira, Noselos, apanhar a N611 na Eucísia, Gouveia, Cardanha e depois Adeganha; a segunda alternativa era perto da Ponte do Sabor, mais concretamente na Quinta da Portela, apanhar a mesma N215, subindo a Estevais, Cardanha e depois Adeganha. Distâncias à parte, porque de automóvel isso importa pouco, optei pela primeira hipótese. Não me arrependi. A paisagem é fantástica e é das melhores estradas panorâmicas do concelho. É pena que o troço de estrada no concelho de Alfandega da Fé, logo depois de Gouveia, quase nem mereça a denominação de estrada, de tão deteriorada que está.

Não me demorei muito no caminho, mas fiz algumas paragens rápidas, para tirar fotografias.
Quando cheguei a Adeganha fiquei surpreendido por ser um aglomerado habitacional tão pequeno. . Já estive uma vez na Adeganha, foi há mais de 15 anos, pouco me recordo. Parei antes de chegar à aldeia, num alto, junto ao depósito da água, na Rua das Cortinhas. Fiz uma “radiografia” rápida, marcando mentalmente alguns pontos a visitar.
As principais ruas estão muito limpas, calcetadas e a circulação é muito fácil. Parei no Largo da Capela, junto à Capela de Nossa Senhora do Rosário, onde há duas amoreiras carregadinhas de amoras negras.
Só a visão da capela, já justificava a visita. Na frente há um pequeno jardim, com gradeamento. Entre várias espécies de plantas aí existentes, há duas roseiras carregadinhas de flores, que dão um ar de subtil beleza. Mas há também a sineira, em arco de volta perfeita e os bonitos pináculos cilíndricos.

A minha vontade era descer rapidamente em direcção à igreja, mas controlei o impulso e segui pela Rua da Escola. A escola está, como tantas outras, praticamente abandonada, à espera de alguma utilização (a de Gouveia, já afecta ao turismo, não tinha melhor aspecto). Respirei fundo e subi pela Rua do Outeiro, a um cabeço (482 metros) de onde se avista toda a aldeia e muitos quilómetros de paisagem em redor. As condições atmosféricas não eram as que gosto para a fotografia, mas era para isso que eu ali estava.

Desci à aldeia e segui para a igreja, Monumento Nacional. O primeiro contacto trouxe-me à memória a Igreja de S. Salvador, no Castelo de Ansiães e a Igreja de Santa Maria, no Azinhoso, Mogadouro.
Depois de uma vista na fachada principal, procurei enquadrar de perto o baixo-relevo representando três mulheres, conhecido pelas Três Marias. Expostas a milhares de olhos desde o Séc. XII, deram origem a uma das mais curiosas histórias existentes no concelho de Torre de Moncorvo. A ideia de que duas das irmãs meteram a terceira numa fogueira, como vingança por ela fazer batota e ganhar todos os jogos de cartas, gritando “arde e ganha”, não deixa de ser curiosa. Não imagino três irmãs a jogar às cartas, no Séc. XII. Partilho da ideia de muitos outros, de que o que está representado é um parto. As duas “Marias” dos lados seguram a terceira Maria, que está de pé, a dar à luz. São visíveis pormenores da vagina e o criança é representada dentro de uma bolsa. Também a figura da criança no canto superior esquerdo tem uma explicação: tem a água e o pano necessários para o parto. O parto, é um momento doloroso e assustador para muitas mulheres. O medo leva-as a recorrer ao divino. Recordo-me de ver entre Mogadouro e Macedo de Cavaleiros uma capelinha da Senhora do Bom Despacho! Terá esta representação, ido ali parar por uma promessa de alguém que passou por grande aflição?
Gastei horas a registar os pormenores dos trabalhos em granito que existem em redor da igreja! Não sou entendido em história mas parece-me que o grosso da construção é do estilo românico notando-se pontualmente outros estilos. O portal é gótico.

É interessante olhar um a um os cachorros que sustentam a cornija. Representam rostos humanos mas também porcos, aves, ovelhas e touros. Há um total de quatro arcossólios com túmulos, três no alçado Norte e um no alçado Sul. A decoração das duas portas laterais também é muito interessante. Há ainda outros elementos decorativos que despertam a atenção: no alçado norte há um baixo-relevo que me parece representar um monge (há quem diga que é um guerreiro); no alçado Sul há um baixo-relevo com duas formas antropomorfas, uma delas deitada, outra ajoelhada; nos alçados laterais e fachada existem abaixo da cornija blocos de pedra salientes designados mísulas, algumas com feições antropomórficas, outras com motivos vegetais. Nestes blocos apoiariam traves que suportariam uma estrutura, criando uma área coberta, que serviria de protecção aos peregrinos que aqui pernoitariam no seu caminho para Santiago de Compostela.

A exploração do interior carece ainda de mais tempo. Apesar da simplicidade e da talha dourada ser muito posterior ao edifício, não faltam os motivos de interesse. Os dois altares que ladeavam o arco triunfal da capela-mor foram retirados, deixando à vista um conjunto de belos painéis de frescos pintados nas paredes.
No altar-mor existe de cada lado, um painel pintado representando S. Martinho e S. Lourenço.
Surpreendeu-me a forma geométrica de alguns elementos decorativos usados nas pinturas das paredes laterais e por detrás do altar-mor! Também atrás do altar, está escondido um fresco representando Santiago Maior mais conhecido por Santiago de Compostela.
No chão da igreja é bem visível uma sepultura datada de 1660.

Embriagado com esta viagem à história, abandonei a igreja e dei uma última volta pela aldeia: Rua da Lagareta, Rua da Capela, Rua do Eivado, Largo da Barreira, Rua Abílio Mateus, Rua Bernardo Magalhães… e um conjunto de becos e travessas. Gostei das placas identificativas das ruas: rústicas, artesanais, completamente enquadradas no ambiente.
Saí de Adeganha com a intenção de ir ao Santuário de Nossa Senhora do Rosário. Depois de percorrer um longo caminho, pareceu-me que estava a descer demasiado em direcção à Junqueira. Achei que me tinha perdido e voltei para trás. Percebi depois que estava no caminho certo. Tenho pena de não ter ido ao santuário. Seria uma visita mais completa à Adeganha e também seria uma oportunidade de ver o Vale da Vilariça de um lugar privilegiado. Ficará para outro dia.

Da Adeganha segui para a Cardanha, depois para Estevais, À Descoberta do concelho de Torre de Moncorvo, terminando o dia no Miradouro de S. Gregório. Aprovei os últimos raios de sol, saturados de laranja, para fotografar a Foz, o Vale, o céu até o próprio sol, quando este esmoreceu.
Foi um tarde cheia de “descobertas”.

sábado, 7 de junho de 2008

Vide


Fotografia da Vide, freguesia da Horta da Vilariça a convidar a uma Descoberta mais próxima. Este povoado, com raízes pré-históricas, já esteve ligado ao concelho de Vila Flor. O seu nome sugere a produção de vinho.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

nem sei o que diga...



Por favor senhores mordomos...

Com um pouquinho de esforço conseguia-se muito bem levar ao ombro o santinho.

Qualquer dia começam a fabricar «Saint´s Mitzubishi»

Coitadas das pessoas que vão atrás durante horas a levar com os gazes (e não são do santo).

Não descaracterizem as procissões.

ora vejam aqui como se faz http://www.antoniobasaloco.org/nsme%20gr.htm

Curiosidade

Vocês sabiam que...
O Museu do Ferro já tem Site?
Faltam só limar umas arestas, colocar uns textitos e pronto.

espreitem
http://www.museudoferroedaregiaodemoncorvo.net

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Antes que o verde se apague

São flores ou alvas nuvens que desceram do céu para dar alegria ao verde?
Umbelíferas junto ao Rio Sabor.
08-05-2008

terça-feira, 3 de junho de 2008

Sanchas (in Contos de Rodapé)

Chegou o dia de fazer a ronda lá naquele sítio, onde as multas eram como as sanchas, por causa do bicho da caça. Os moradores entendiam que os limites já ultrapassavam tudo e, por isso, preparam uma recepção ao Inácio e ao Acácio que vinham à pata desde o posto da vila de Moncorvo. Saiu-lhes na rifa do serviço a visita ao martirizado povo da Lousa, enquanto o sargento da G.N.R. montava a única mota de soco, designação bem popular para o side car, que existia no quartel.
A caminhada fez-se logo de manhãzinha e, passado algum tempo, já os dedos dos pés se zangavam com as paredes das botas. Tiveram o préstimo de umas fragas que lhes ajudaram a encolher a língua que teimava lamber o queixo. O caminho ainda estava meio por cumprir e os bornais batiam-lhes nas costas a pedir para serem aliviados, mas o repasto só seria num banco da taberna no local de destino. Podia ser que ainda apanhassem algum caçador em contramão, ou algum filho menor de pastor com o rebanho! Assim o rol de multas podia fazer brilhar os galões da falta de bom senso.
À hora que os bornais de cotim militar, recheados de pão, chouriça e queijo, deixaram de beliscar as capas dos guardas, estavam estes a escolher um banco mais recôndito da taberna.
- Ora muito bom dia, traga cá dois copitos para fazer escorregar melhor esta merendola ! – fumegavam as palavras dos encapotados.
- É para já meus senhores ! Bem precisam de comer e beber porque a faina é pesada! – remordeu o taberneiro com um olhar seco.
- Pois está claro, também não viemos aqui por umas cascas de alho...
- Os alhos irão ser engolidos inteirinhos! - remoeu o homem, enquanto lavava o sarro de uns copos.
As espingardas que tinham estado a descansar, encostadas à parede do tasco, desapareceram num bocejo e voltaram depois, nas mãos de uns manganões lá da terra.
- Não sabem no que se metem! Passem para cá as armas! - berraram os guardas.
- Oh, oh! Não se deve deitar fora a nossa energia antes de se começar a trabalhar! Poupem-se bem poupadinhos, porque o arado já está à vossa espera. E já agora, vamos até àquela horta, para aparelhar as crias! - ordenava, entre risos sérios, um dos malandrecos.
Não faltaram mãos amigas a colocar-lhes a belfa no cachaço, a canga e todos os arreios. Assim que estavam prontos, rebentaram as vozes de incentivo aos rebocadores do arado. Até o burro da horta juntava a sua voz à da população, agraciado com menos um cibo de terra para virar.
Mais esverdeados que duas sanchas, não só pelo esforço de revolver o cabelo da terra, mas também pelo medo à gente da Lousa, lá regressaram ao posto com o coiro moidinho, os pés de chumbo e o bornal a dançar ao sabor das passadas.

Cornalheira (Pistacia terebinthus)


Uma estrela de quatro pontas.
Ribeira, próximo do Douro, Moncorvo.
Abril de 2007

Nossa Senhora de Fátima


Esta imagem de Nossa Senhora de Fátima, no Castedo, está situada num rochedo junto ao parque infantil, no lugar conhecido como paragem. Perto deste parque, fica o Bairro Novo (antiga Rua do Curvato).
(01-06-2008)

domingo, 1 de junho de 2008

Vigiando o vale

No Dia da Criança, tentei tirar os meus dois rebentos da frente dos ecrãs que os (nos) escravizam. O passeio foi longo, mas um dos momentos mais entusiasmantes foi quando fizemos uma incursão, monte a dentro, junto a Cabeça de Mouro. A paisagem que se avistava era magnifica e não resisti a tentar captar toda a imensidão numa só fotografia. A tarefa foi árdua, eis o resultado.

Asphodelus ramosus

Com a sua haste depois de seca, faziam as flechas para os arcos, nas brincadeiras de infância ( Açoreira - Torre de Moncorvo).
Fotografada em 13-4-2006, Torre de Moncorvo.

Pauta e flauta

Sequeiros - Torre de Moncorvo, 24-3-2008.

Flora de Brincadeiras

Os botões da tasneirinha ( Senecio vulgaris L.), com as suas cores verde e amarela, prestavam-se para fazer espargos com ovos. ( Torre de Moncorvo).

Esta pequena flor de Jasione Montana representava um queijinho nas brincadeiras e passatempos infantis, sobre culinária ( Torre de Moncorvo / Freixo de Espada à Cinta).

Fotografia registada em Sequeiros - Torre de Moncorvo.


A canafrecha (Tapsia Villosa) era utilizada na construção de brinquedos, tal como o arado que a foto anterior representa ( contruído por António Dias, octogenário).

Fotografias registadas em Sequeiros - Torre de Moncorvo, em 14 de Janeiro de 2006.

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